Tema

Avenida, Meu Amor!

Regina Maria

    Sigo a trilha do verbo amar. Sinto-me apta a definir o mundo a partir dessa única palavra - AMOR. Sob o amparo dela, redimensiono a história de minha cidade, a bem dizer nos passos de uma Avenida chamada AMOR.

    O amor tomba aos chãos como migalhas, voa aos ares como as plumas; se põe à mesa dos apóstolos e reparte o pão - como tributo ao milagre... Quem tem fé, perpassa o milagre das origens. Muda as estrelas, conquista algo a qual se diz, se revela; a si e aos que estão à volta. Original é o amor que transborda de nossa aldeia para o Mundo.

    Aqui, tomamos duas vertentes: aquilo que é das origens, a cultura, nosso grei. Segundo, o que vem nos reinventar. Onde somos únicos, valiosos, diferentes. Onde nos ultrapassamos, nos esmeramos, nos sabotamos ou nos surpreendemos.

    Amor, um território amplo demais para contê-lo em uma avenida. Mas nessa avenida, nesse rumar de passos e casarões, quantas histórias de amores. Num metro quadrado, num banco de praça acocoram-se milhares de beijos e outros milhares de desesperos. Amores contrariados, amores avariados, amores vividos, amores desperdiçados.

    Os temas ao nosso alcance são recorrentes. Chamo a ânsia dos saraus e dos bailes regados a "soirée", o piano toca enquanto se toma maçãs embebidas na cidra - o ponche.

    O banco da praça é o descanso da conquista. Ali se põe a versar e a namorar.  A banda passa e se pode ver os beija flores na gaiola gigante enquanto os meninos escorregam no Monumento Rosa em frente ao hospital Imaculada. Assim é que me lembro.

    Então, o tempo vem vestindo os transeuntes. Os postes onde se amarravam os cavalos se vestem de luzes altas no centro da praça e as palmeiras enfileiram os passos e alteiam os olhos para o templo. Há um coreto, uma árvore e uma igreja no meio do caminho.

    A Avenida é de quem dela se apropria no instante. O velho que amansa o banco, os meninos esperando o começo da escola, os fiéis com seus passos apressados indo à Igreja. As floricas amarelinhas das sibipirunas ao chão. O pai deitado ao banco com o filhote ao peito. As tribos da bicicleta. Os patins... Os travestis pedintes na noite... as rodas de conversas e babás com bebês nas manhãs. Os cuidadores e o andar do velho de olhar perdido. A moça lendo o livro de Altino. De lá pra cá, o vaivém.

    A avenida é de quem dela se apropria no instante. Lugar para manifestações culturais. Lugar dos destinos das artes. Do Encontro, da alegria e do espanto. Onde todos passam. O coração da cidade.

    A arte é a radiografia da psique a explorar as vias dos encontros e desencontros. Ela cobra os excessos, os clamores e as faltas. Sobrevive às superfícies e prova o intenso. Clarice diz; "amadureci vendo pessoas que amo me trocando".

    Mas o homem não se conforta no amor que se troca e nem apenas na maturidade. O homem quer amanhecer de novo e prosseguir sua busca de sentido da vida. A falta de zelo das flores, de zelo de estima, de zelo de vida, súplica que o sentimento não se resguarde, que seja profundo, que se revele o grau de desleixo de cada qual.

    O desmazelo da gentileza vem nos insultando e requer luvas de esperanças. Esse jardim precisa de água. Esse chão que piso requer alívio nas rachaduras. Os postes não precisam do açoite de fios mal arranjados. Os bancos querem o trato de outrora.

    Sob o feito das janelas alinham-se as promessas de respeito. A Máxima do amor vem com ATENÇÃO.

    A música, a dança, o teatro de versos. A comida de festa, os retratos de época bordados nas palavras, nos vestidos da moda. A banda anuncia que teremos orquestras. A dança venera o poeta das borboletas para governar o mundo. Num modo particular de relacionar, frequentamos o teatro humano. Afinal qual será o nosso repertório quando o tema trás o NÓS VESTIDOS DE  AMOR?  Mulher terra flor, palavra poesia para falar de amor.

    Brasil, Minas, uma avenida chamada Amor em Patos de Minas em setembro de 2017, pede a benção aos "intérpretes cujas obras abrem o cofre do coração para reconhecermos a senha da nossa identidade. Para abrirmos a porta de nossa própria casa para arejar os retratos de nossos avós índios, negros e mestiços". Pede benção para que se aporte o cerne de uma cultura que surge nas tradições. Pede a benção aos espíritos do Amor para que se benfazeja nossa brasilidade!

Balaio 2017 - Avenida, Meu Amor - de 06 a 10 de setembro